Estudos Sociedade e Agricultura

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Nelson Giordano Delgado

Política ativa para a agricultura e Mercosul: observações a partir do caso brasileiro


Estudos Sociedade e Agricultura, 5, novembro 1995: 103-113.

Trabalho apresentado no Seminário Internacional “Argentina frente a los procesos de integración regional: los efectos sobre el agro”, organizado pela Faculdade de Ciências Agrárias da Universidade Nacional de Rosario e pela Federación Agraria Argentina e realizado em Rosario de 08 a 11 de agosto de 1994. Algumas discussões com Jorge O. Romano do CPDA/UFRRJ foram muito úteis para a elaboração deste texto.

Nelson Giordano Delgado é professor da UFRRJ/CPDA.


O objetivo deste ensaio é duplo. Em primeiro lugar, pretende indicar a relevância que a adoção de uma política agrícola ativa teve para a modernização da agricultura brasileira nas últimas décadas. E, em segundo, sugere e discute algumas das possíveis implicações que os processos de liberalização comercial e de integração regional dos países do Mercosul podem trazer para a formulação e a execução de políticas ativas no âmbito nacional.

1. O Brasil é um país latino-americano que se caracterizou, a partir do pós-guerra e, em especial desde a década de 60, pela execução de uma política agrícola ativa.

Estamos entendendo por política agrícola ativa a existência - dentre as políticas econômicas governamentais - de uma política setorial para a agricultura, calcada em instrumentos específicos, e que se distingue claramente da política macroeconômica geral. É claro que a política macroeconômica pode trazer implícita uma política agrícola determinada, como, por exemplo, quando as desvalorizações da taxa de câmbio real motivadas por problemas na balança comercial alteram os preços relativos dos produtos agrícolas a favor dos tradables, estimulando a produção para exportação em detrimento do abastecimento interno. Nessa situação, a alocação de recursos e a composição da produção podem ser afetadas pela política estatal, independentemente da política setorial: seja porque essa não existe, seja porque é anulada pela política macro. Em tal caso, embora a produção agropecuária seja afetada pela intervenção do Estado - e em algumas circunstâncias de forma significativa - não se pode falar na existência de uma política agrícola ativa.

2. Queremos destacar duas características da política agrícola ativa no Brasil. Em primeiro lugar, a política agrícola/setorial pode ser meramente compensatória dos vieses antiagrícolas da política macroeconômica - expressos principalmente através das políticas cambial, comercial e fiscal. Essa normalmente é a visão que se tem da função principal da política setorial no chamado período da “industrialização por substituição de importações”, predominante na América Latina até o final dos 70, aproximadamente, dependendo de cada país.[1] De modo geral, há um consenso de que a agricultura foi, com intensidade diversa, penalizada em todos os nossos países pela política macroeconômica industrializante implementada na América Latina nesse período.[2]

No caso brasileiro, no entanto, pode-se afirmar com segurança que a política agrícola não foi meramente compensatória, não teve apenas um caráter de soma zero, mas que - principalmente a partir do final dos anos 60 - esteve comprometida com a modernização do setor, com a sua transformação agroindustrial e com a sua progressiva internacionalização. Dessa forma, o PIB agrícola brasileiro cresceu a uma taxa média anual de 4-4,5% desde a segunda metade da década de 50 - tanto em períodos de vigoroso crescimento industrial (como na segunda metade dos anos 50 e na década de 70), como em conjunturas de desempenho industrial bastante sofrível (como nos anos 80) - e a agricultura nunca foi um obstáculo à industrialização do país, apesar da proteção efetiva dos produtos agrícolas no pós-guerra ter sido em grande parte ou negativa, ou pelo menos inferior a dos produtos industriais. (Cf. Bergsman, 1970; Banco Mundial, 1986).

Em segundo lugar, a política agrícola no Brasil não se concentrou apenas nos produtos de exportação, mas teve um caráter mais abrangente, atingindo as matérias-primas para a indústria doméstica e também os produtos alimentares, especialmente seus segmentos capitalistas de produção. O estudo recente de Beskow (1994) sobre a atuação da Carteira de Crédito Agrícola e Rural (Creai) do Banco do Brasil, criada em 1937[3], demonstra que, mesmo na época de predomínio do café e do complexo cafeeiro, a política governamental já revelava uma preocupação importante com a produção agropecuária para o mercado interno, especialmente nos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais.[4]

3. É claro que o reconhecimento da existência de uma política agrícola ativa no Brasil não implica a apologia do tipo de política implementado. No geral e especialmente na década de 70, essa política foi excludente de grupos sociais relevantes (como os pequenos agricultores e os trabalhadores assalariados), aumentou a concentração da renda e da riqueza no meio rural - pois esteve mesclada a uma política agrária de modernização do latifúndio - e acirrou as desigualdades na divisão regional do trabalho rural no país ao beneficiar basicamente o Centro-sul, que incrementou ininterruptamente sua participação na produção dos principais produtos agroindustriais e agroalimentares.

No entanto, a constatação, mesmo que sumária, da existência dessa política ativa nos faz reconhecer que no caso brasileiro o crescimento e a modernização do setor agrícola não foram uma mera decorrência do crescimento da demanda privada, doméstica e/ou internacional. Na década de 70, o desempenho favorável do mercado internacional estimulou fortemente a produção para exportação (a soja é o exemplo paradigmático), mas a elevação da renda interna - o PIB total per capita cresceu em média 6,1% a.a. nessa década - não foi acompanhada por um crescimento satisfatório da produção para mercado interno, como já foi fartamente documentado em vários estudos.[5] Essa situação paradoxal se explica pela importância da política de crédito rural subsidiado nos anos 70 - o crédito agrícola foi sempre uma parcela muito elevada da renda agrícola, por exemplo: 102,5% em 1975, 94,6% em 1976 (quando o crédito total começa a ser reduzido) e 79% em 1980 - que favoreceu principalmente os produtos de exportação, aumentando ainda mais a sua rentabilidade em relação aos de mercado interno.

Na década de 80, por sua vez, o desempenho do comércio internacional, especialmente na sua primeira metade, foi bastante desfavorável - devido à crise do mercado mundial: queda de preços, queda do volume de comércio, deterioração dos termos de troca - e o PIB total per capita teve um desempenho medíocre: cresceu à taxa media anual de 0,8% entre 1980/89, o que levou a que essa década fosse considerada como a “década perdida”. Entretanto, a produção para exportação continuou crescendo - embora é claro a um ritmo inferior ao da década anterior - graças à política cambial (as desvalorizações da taxa de câmbio) e de subsídios às exportações. A produção para o mercado interno reverteu o seu mau desempenho prévio - superando inclusive a performance da produção para exportação - como conseqüência da política de preços mínimos e de aquisições pelo governo federal, e da desova de inovações tecnológicas realizadas por organismos governamentais (e alguns privados), que viabilizaram grandes aumentos nos rendimentos físicos das culturas domésticas (como, por exemplo, trigo, arroz, algodão e, em menor intensidade, milho). Ademais, a contribuição direta da produção agrícola para o ajuste externo foi pequena: o aumento do saldo da balança comercial agrícola explica somente 15% do aumento do saldo da balança comercial entre 1980/82 e 1985 (a partir de 1984, o Brasil começou a produzir saldos na balança comercial da ordem de mais de 10 bilhões de dólares). Como disseram Goldin e Rezende (1993: 78), “a crise externa tornou claro que a principal contribuição da agricultura, numa economia com a dimensão e com a base industrial como a brasileira, reside na contínua melhoria do abastecimento interno”. Note-se que esse comportamento da produção agrícola nos anos 80 ocorreu numa conjuntura em que o crédito rural total foi bastante reduzido - em 1984 chegou a atingir apenas 37% de seu valor em 1979 e somente superou o valor de 1979 em 1988. As distorções provocadas pelo crédito na década anterior foram reduzidas, e a rentabilidade relativa das culturas domésticas aumentou vis-à-vis às de exportação: os índices de preços reais de ambas caíram ao longo da década, mas os das primeiras caíram menos do que os das últimas.

4. A questão que nos interessa agora - e para a qual precisamos começar a formular interrogações - é saber como o “ativismo” da política agrícola, por falar assim, é, tem sido ou poderá vir a ser afetado pela política macroeconômica, pela integração comercial regional, e pela combinação de liberalização comercial nos nossos países e resistência do protecionismo nos países industrializados.[6]

Em relação à política macroeconômica, é interessante observar que a política agrícola tem conseguido, nas últimas décadas, se adaptar às mudanças macroeconômicas, as quais - como esperamos ter indicado sinteticamente - não comprometeram seu caráter ativo, pelo contrário, favoreceram as exportações agrícolas nos anos 80, através de desvalorizações contínuas da taxa de câmbio para enfrentar o estrangulamento externo do início da década.[7]

A política macroeconômica da “industrialização por substituição de importações”, com suas taxas de câmbio real valorizadas e excessiva proteção à atividade industrial, penalizou a agricultura, especialmente de exportação, mas não impediu a adoção de políticas agrícolas ativas e o crescimento setorial. O período de maior penalização da agricultura brasileira - como mostrou Oliveira (1984a e b) - foi a segunda metade da década de 1950, quando a política governamental provocou um verdadeiro arrocho da renda agrícola, pois a queda do preço do café no mercado mundial foi acompanhada por uma política cambial que aumentou, internamente, a extração de recursos do setor. A partir dos anos 60, como indicamos, vários segmentos agrícolas foram penalizados através dos controles quantitativos das exportações (por exemplo de soja), em favor da indústria doméstica, e dos controles de preços de alimentos - de acordo com uma política de industrialização baseada em mão-de-obra barata - mas essa penalização foi consideravelmente compensada nos anos 70 pela política de crédito rural subsidiado, especialmente para os setores capitalistas e para os interesses agrários voltados para a exportação. Na década de 1980, como indicamos, as políticas cambial, de preços mínimos e tecnológica viabilizaram o crescimento agrícola em um ambiente macroeconômico interno e externo bastante desfavorável. No final dos anos 80, no entanto, a aceleração da inflação e o fracasso recorrente de uma seqüência de planos de estabilização intervencionistas acabaram inviabilizando a política agrícola executada na década, introduzindo uma enorme instabilidade nas expectativas e aguçando o caráter especulativo da formação dos preços das commodities, o que desembocou numa crise agrícola em 1991 e 1992 (Cf. Rezende 1992; Goldin e Rezende, 1993).

Talvez se possa concluir esse ponto dizendo que, embora a política macroeconômica não tenha inviabilizado sistematicamente a adoção de uma política agrícola ativa no Brasil nas últimas décadas, a experiência do final dos anos 80 e do início dos 90 parece apontar para o fato de que a agudização da inflação e o fracasso das políticas de estabilização começaram a impor limites crescentes à possibilidade de dar seguimento à política ativa, ao inviabilizar as políticas de crédito, de preços mínimos e tecnológica, que foram - junto com a política cambial nos anos 80 - seu sustentáculo principal. Isso significa que, a partir daqui, a conquista da estabilidade macroeconômica passa a ser um pressuposto e, ao mesmo tempo, uma restrição importante à continuidade da política agrícola ativa no país.

5. Por fim, algumas breves observações sobre as conseqüências da integração regional sobre a formulação e a execução de políticas agrícolas ativas no nível nacional.

É indiscutível que um processo de integração regional, como o do Mercosul, impõe limites ao “ativismo” da política econômica nacional. Num sentido muito pleno, a integração - da mesma forma que a abertura da economia para o exterior - significa a decisão dos países participantes de abrirem mão da implementação de políticas agrícolas unilaterais: integrar-se é perder graus de liberdade, de autonomia na execução de políticas estritamente nacionais. Assim, a menos que a estrutura produtiva agrícola e agroindustrial dos países membros seja absolutamente complementar, com ausência de competição entre os segmentos, a harmonização regional das políticas econômicas é indispensável para um avanço mais equilibrado e consistente da integração, impedindo que alguns países ganhem às custas dos demais, não como conseqüência de vantagens comparativas (estáticas ou dinâmicas) estruturais em determinadas atividades produtivas, mas simplesmente pelo manejo diferenciado da intervenção governamental. Os subsídios às exportações e a política de desvalorização cambial são exemplos conhecidos de como certos países podem se apropriar do que poderíamos chamar de rendas institucionais regionais ou internacionais, em detrimento de outros.

Ao mesmo tempo, é imperativo reconhecer que se não existe complementaridade absoluta na estrutura produtiva dos países participantes, o processo de integração requer a execução de políticas econômicas ativas tanto no plano nacional como no regional, pois tenderá a afetar diferenciadamente os diversos segmentos produtivos em cada um dos países, segundo sua capacidade competitiva e seu poder de apropriar-se das rendas produzidas pela integração ou de evitar os custos inerentes à sua implantação.

De um lado, é indispensável que os vários segmentos produtivos domésticos mantenham ou incrementem a sua capacidade competitiva nos mercados nacionais, regionais e extra-regionais. Ademais, muitos grupos de produtores poderão tender a ser excluídos de suas atividades como conseqüência da integração, o que requer a execução de políticas agrícolas ativas, compensatórias ou de reconversão produtiva, de modo a garantir a sua reinserção à economia nacional, evitando que a integração comercial se torne um fator de incremento da exclusão social e da concentração da renda e da riqueza. Por outro lado, a execução de políticas agrícolas ativas também em nível regional é importante para que o Mercosul, como bloco regional, aumente sua capacidade de competição no mercado internacional, em sua interação com outros blocos regionais, ganhando maiores parcelas do comércio mundial de produtos agroalimentares ou retendo os espaços já conquistados, o que dificilmente seria concebível através da ação descoordenada de cada um dos países membros considerados individualmente.[8]

Em suma, queremos destacar que a existência do Mercosul, mais do que debilitar ou reforçar a necessidade de uma política agrícola ativa, tenderá a complexificar consideravelmente o processo de decisão e execução dessa política, dado que surgirão novos espaços de decisão institucional da política agrícola, que exigirão a definição de novas metodologias para a tomada de decisões nesse campo.

Por um lado, continuarão existindo espaços nacionais onde serão decididos quais são os interesses agrários e agroindustriais prioritários, e quais são os interesses nacionais prioritários. O fundamental no primeiro caso será manejar os conflitos intra-setoriais, enquanto no segundo deverão ser arbitrados os conflitos intersetoriais. Em qualquer das situações, a questão central é a definição de mecanismos e espaços democráticos de arbitragem e de regulação de conflitos no interior da sociedade civil, da burocracia estatal e no seu inter-relacionamento, de modo que as prioridades da política agrícola sejam obtidas consensualmente - como cabe numa sociedade democrática - respeitadas as restrições estabelecidas pelas prioridades nacionais. Assim, é muito provável que o Mercosul venha a exigir uma melhor explicitação dos interesses dos diversos atores sociais agrários e agroindustriais existentes nos nossos países e, possivelmente, estimulará o surgimento de novas formas de ação coletiva e de representação desses interesses, já que a concertação acerca das prioridades setoriais será fundamental para que possam ser sustentadas com sucesso nos diversos fóruns onde se debaterá e se decidirá sobre o elenco das prioridades nacionais. Dado o caráter segmentado que a nossa integração regional vem assumindo, é razoável supor, por exemplo, que a exigência de representação de interesses por cadeias produtivas venha a ganhar importância progressiva com a consolidação do Mercosul.[9] Por outro lado, é de se esperar que surjam novos espaços regionais/supranacionais para a formulação e a execução da política econômica, onde serão administrados os conflitos intra-Mercosul, compatibilizadas as diferentes prioridades nacionais, e definidos os interesses e prioridades (regionais) do bloco, bem como sua estratégia em relação ao resto do mundo. No que se refere especificamente à agricultura, é nessa instância que deverão ser tomadas decisões sobre temas como tarifa externa comum, protecionismo, abertura comercial, acordos com outros blocos regionais e, é claro, política agrícola ativa em nível regional. Nesse novo cenário que se avizinha para a formulação e a execução das políticas econômicas nacionais e regionais, é forçoso reconhecer que ainda está em aberto a questão de saber quais são exatamente as possibilidades e quais são o significado e o alcance de políticas agrícolas ativas num contexto no qual as arenas de decisão política se complexificam consideravelmente, com a superposição de espaços nacionais e supranacionais e com o surgimento, muito provável, de novos interesses e de novas formas de ação coletiva - assim como de diferenciada capacidade de iniciativa política e econômica - por parte dos antigos e dos mais recentes atores econômicos e sociais que moldam o setor agrário-agroindustrial do Mercosul. De qualquer modo, apesar das indefinições ainda existentes, não é difícil imaginar um elenco mínimo de políticas em torno do qual a definição consensual de uma política agrícola ativa - que seja capaz de compatibilizar interesses nacionais e regionais - poderia ser organizada: as políticas compensatória - centrada na reinserção produtiva dos agricultores penalizados pela integração e na instrumentalização do imposto compensatório sobre as importações subsidiadas - tecnológica, de infra-estrutura, de recursos naturais e meio ambiente, e de segurança alimentar regional. Muito mais difícil seria, nesse momento, a obtenção de um consenso regional acerca de políticas de caráter mais regulatório ou que poderiam implicar, em função dos subsídios implícitos, ganhos diferenciados para os países membros, tais como as políticas de preços, de crédito rural, fiscal e cambial. Tudo indica que, nesse aspecto, o consenso dependerá, por um lado, da possibilidade de que os países - especialmente Argentina e Brasil - consigam harmonizar suas políticas macroeconômicas e ser bem-sucedidos no controle da inflação e na retomada do crescimento econômico, e, por outro, que a integração se traduza no incremento das trocas intra-regionais e no aumento do poder de barganha do Mercosul no comércio mundial, de modo que os países possam considerar o movimento de integração como um ganho efetivo para todos.

Referências bibliográficas

Banco Mundial. Informe sobre el desarrollo mundial. Washington D.C.: Banco Mundial, cap.4, 1986.

Beskow, Paulo Roberto. O crédito rural público numa economia em transformação. Estudo histórico e avaliação econômica das atividades de financiamento agropecuário da Creai/BB, de 1937 a 1965. Tese de doutorado apresentada à Unicamp, 1994.

Bergsman, Joel. Brazil. Industrialization and trade policies. Londres, Oxford University Press, 1970.

Delgado, Nelson Giordano. Políticas diferenciadas de desenvolvimento rural no Brasil. Rio de Janeiro, IICA, julho de 1989.

Delgado, Nelson Giordano et al. (L. Lavinas, R. Maluf e J. Romano). “Libre-échange, ajustement structurel et agriculture: le cas du Brésil”. In: J. Zylberberg e F. Demers, eds., L’Amérique et les Amériques. Sainte-Foy. Les Presses de l’Université Laval, 1992: 449-472.

Delgado, Nelson Giordano et. al. (L. Lavinas, R. Maluf e J. Romano). Integração econômica regional, estratégias agroindustriais e grupos sociais rurais: o caso do Mercosul. Rio de Janeiro, Ibase/Fondad, mimeo, 1993.

Goldin, Ian e Rezende, Gervásio Castro de. A agricultura brasileira na década de 80. Crescimento numa economia em crise. Rio de Janeiro, Ipea, 1993.

Lopes, Mauro de Rezende. “Acordo agrícola: uma paz armada”, Conjuntura Econômica, 48 (4), abril, 1994a: 19-21.

__________. “Reformas agrícolas: os custos dos ajustes parciais”, Conjuntura Econômica, 48(7), julho, 1994b: 25-29.

López Cordovez, Luis . “Crisis, políticas de ajuste y agricultura”, Revista de la CEPAL, 33, Diciembre, 1987: 7-30.

Oliveira, João C. “Incidência da taxação implícita sobre produtos agrícolas no Brasil: 1950/74”, Pesquisa e Planejamento Econômico, 14(2), agosto, (1984a): 399-452.

__________. “Transferência de recursos da agricultura no Brasil: 1950/74”, Pesquisa e Planejamento Econômico, 14(3), dezembro, 1984b: 773-821.

Rezende, Gervásio Castro de. “Do cruzado ao Collor: os planos de estabilização e a agricultura”, Revista de Economia Política, 12(2), abril-junho, 1992: 106-125.

 

Notas

[1] Essa, por exemplo, é a visão expressa em López Cordovez (1987). Talvez seja mais correto dizer que esse ‘modelo’ de industrialização predominou até o final dos 70 apenas no Brasil e, talvez, no México, pois nessa época as economias da Argentina e do Chile já estavam experimentando políticas monetaristas, de liberalização comercial e financeira.

[2] O Banco Mundial tem se esforçado muito para demonstrar essa tese. Se consideramos todo o período 1947/77, a discriminação contra a agricultura no Brasil foi mais intensa nos subperíodos de mais acelerada expansão industrial, 1953/61 e 1967/73. A política cambial foi, antes de 1961, o mais importante instrumento de política de preços para a transferência intersetorial de renda, enquanto os controles quantitativos de matérias-primas agrícolas exportáveis e os controles de preços domésticos de alimentos ganharam maior relevância a partir do final dos 60. Note-se contudo, que com a política de crédito rural subsidiado dos 70, a taxação sobre a agricultura tornou-se mais seletiva: as transferências de renda ocorreram principalmente dos agricultores menos capitalizados e mais pobres em favor dos grupos capitalistas tanto urbanos como rurais. Para maiores esclarecimentos veja-se os artigos de Oliveira (1984a e 1984b), que são, até agora, o melhor estudo sobre o assunto no Brasil.

[3] “no contexto de um projeto mais amplo de modernização econômica, voltado para o apoio estatal à industrialização e à diversificação da produção agropecuária, sem o abandono da agricultura exportadora e não colocando em risco a hegemonia da grande propriedade rural (capitalista ou não) no campo, e dentro de uma visão econômica autarquizante, a qual procurava internalizar ao máximo as atividades econômicas consideradas estratégicas.” (Beskow, 1994: 412). O sublinhado foi acrescido ao texto original.

[4] “No período de 1930 a 1945, uma das principais mudanças da política agrícola foi sua passagem do âmbito estadual para o federal. Embora ainda de uma forma muito incipiente, foi nessa época que surgiu pela primeira vez no país uma estratégia para o conjunto do setor agrícola, em contraposição a medidas voltadas exclusivamente para a defesa de certos produtos de exportação. Isso começou a ocorrer mais nitidamente a partir de 1937, com o Estado Novo, e devido às novas circunstâncias criadas pela II Guerra Mundial.” (Beskow, 1994: 410).

[5] Como, por exemplo, em Delgado et al (1992), Goldin e Rezende (1993), e Delgado (1989) e na bibliografia aí referida. Os dados e as conclusões abaixo mencionados foram ou retirados desses textos ou sugeridos pelas análises e pelas informações neles contidas.

[6] Esse último ponto não será desenvolvido no texto. Note-se, porém, que existem evidências de que a liberalização comercial unilateral, indiscriminada e parcial - no sentido de que a redução do protecionismo seja mais acentuada internamente para os produtos agrícolas do que para os manufaturados e não tenha sido acompanhada internacionalmente por uma liberalização correspondente nos países centrais - pode ter conseqüências desastrosas para os setores agrícolas nacionais. No caso do Brasil, a reforma tarifária de 1990, no governo Collor, reduziu as tarifas agroindustriais de 62% para 12% em 1994 (abaixo da alíquota média para os produtos industriais de 14%) e os produtos agrícolas in natura ficaram com tarifas uniformes de 10%, embora para alguns produtos, como o feijão e o algodão, entre outros, as tarifas tenham sido zeradas. Essa discriminação contra o setor rural no processo de abertura da economia levou a uma queda da proteção efetiva da agricultura, que ficou abaixo da nominal. Como conseqüência da abertura comercial, da desregulamentação dos mercados e dos consideráveis cortes nos gastos públicos com o setor, o Brasil alcançou em 1993 uma nova posição de grande importador de cereais, grãos e fibras. Nesse processo, a área plantada com trigo reduziu-se 40%, o mesmo ocorrendo com o algodão - para o qual o país passou de quarto exportador mundial a segundo maior importador - e estima-se que os estados produtores desses dois produtos perderam cerca de 350 mil empregos na agricultura a partir de 1992 (também houve aumentos crescentes nas importações de arroz e de milho). Para maiores detalhes a respeito, consulte-se Lopes (1994b).

[7] Ao contrário do que ocorreu com as políticas diferenciadas de desenvolvimento rural, que foram afetadas negativamente pelo manejo da política macroeconômica (Delgado, 1989). Note-se, no entanto, que essas nunca foram prioritárias na política econômica brasileira nas últimas décadas. Sempre operaram à margem: o máximo de prestígio político que conseguiram no plano federal foi serem identificadas com políticas de desenvolvimento regional (para o Nordeste do país). Um dos desafios importantes para a implementação institucional dessas políticas é, portanto, conseguirem fazer parte das prioridades governamentais ao nível descentralizado: estadual e municipal.

[8] Isso é particularmente importante no que diz respeito à reação dos países do Mercosul diante do aumento do protecionismo nos países industrializados. Por exemplo, o Acordo Agrícola da Rodada Uruguai do GATT acabou incluindo a chamada Cláusula de Paz do Acordo de Blair House entre Estados Unidos e União Européia que limitou consideravelmente o direito dos países membros de acionarem os dispositivos de salvaguarda - entre os quais o direito compensatório - através dos quais os seus interesses poderiam ser defendidos sempre que fossem ameaçados pela deturpação da concorrência interna e externa produzida pelos subsídios às políticas agrícolas domésticas e às exportações nos países industrializados. Essa nova situação debilitou a capacidade de reação dos países periféricos ao protecionismo do centro e passou a exigir uma atenção especial dos países do Mercosul no sentido de definirem tarifas externas comuns mais elevadas para os produtos agrícolas e de porem em prática, articulada e rigorosamente, o instrumento do imposto compensatório sobre as importações de produtos subsidiados. Para uma breve mas elucidativa discussão a respeito, consulte-se Lopes (1994a).

[9] Para um maior aprofundamento dessa discussão veja-se Delgado et alii (1993).