Estudos Sociedade e Agricultura
Victor Pelaez & Wilson Schmidt
A difusão dos OGM no Brasil: imposição e resistências
Estudos Sociedade e Agricultura, 14, abril 2000: 5-31.
Resumo: (A difusão dos OGM no Brasil: imposição e resistências). Autorizados para comercialização nos EUA desde 1994, os Organismos Geneticamente Modificados (OGM) ou trangênicos difundiram-se rapidamente naquele país e em outros importantes produtores de commodities agrícolas nas Américas, como Canadá, México e Argentina. O Brasil, no entanto, manteve-se, até o momento, à margem deste processo. Analisar, a partir do caso mais concreto da soja Roundup Ready, os fatores que limitam o processo de difusão dos OGM no Brasil, é o objetivo deste artigo. Procura-se indicar como a atual resistência aos transgênicos, por parte de organizações ligadas à agricultura familiar brasileira, representa uma continuidade de um processo, iniciado no final dos anos 1970, de questionamento do modelo agrícola adotado no país e de combate às regulamentações que lhes são favoráveis. O artigo enfatiza a polarização de interesses resultante das estratégias de apropriação da Monsanto, apoiadas por ações “colaboracionistas” do governo federal, e as dos agricultores de se (re)apropriarem dos conhecimentos e do material vegetal que utilizam e melhoram.
Palavras-chave: transgênicos, Monsanto, produção familiar, Rio Grande do Sul.
Abstract: (The Diffusion of GMOs in Brazil: Imposition and Resistence). Authorised for marketing in the US since 1994, Genetically Modifed Organisms (GMOs) or transgenics became rapidly diffused in that country and in other important producers of agricultural commodities in the Americas – Canada, Mexico, Argentina. Brazil, however, to date, has kept itself apart from this process. On the basis of the example of Roundup Ready soybeans, this article analyses the factors which are restricting the diffusion of GMOs in Brazil. In particular, it shows how the current resistance to transgenics, on the part of organisations linked to family farming, represents the continuation of a process begun in the 1970s of questioning the agricultural model adopted in the country and combating regulations favouring this model. The article emphasises the polarisation of interests resulting from Monsanto's strategies of appropriation, supported by collaborationist actions of the Federal Government, and the efforts of farmers to re-appropriate both the knowledge and the plant material which they use and improve
Key words: trasngenics, Monsanto, family farming, Rio Grand do Sul.
Artigo escrito no âmbito do Convênio Capes-Cofecub entre o grupo CTESI (Cambio Tecnológico e Evolução de Sistemas Industriais), Montpellier, França, coordenado por Pascal Byé e o CPDA/UFRRJ, coordenado por John Wilkinson.
Victor Pelaez é professor do Departamento de Economia da UFPR.
Wilson Schmidt é professor do Departamento de Zootecnia e Desenvolvimento Rural da UFSC.
Introdução
Em 1998 o grupo industrial Monsanto, tradicionalmente instalado na indústria química desde 1901, anuncia a sua divisão em duas partes: uma que mantém as atividades ligadas à fabricação de produtos químicos em geral e outra que compreende as atividades relativas à produção de medicamentos, agroquímicos, substâncias alimentares e organismos geneticamente modificados (OGM). Esta última torna-se a parte majoritária do grupo, conservando o nome Monsanto, autodesignando-se uma empresa especializada nas “ciências da vida”. A reestruturação do grupo deve-se fundamentalmente às atividades voltadas ao desenvolvimento dos OGM, sobretudo a partir da obtenção de sementes transgênicas (soja, algodão, milho, batata) resistentes a insetos e ao herbicida Roundup. Autorizados para comercialização nos EUA, desde 1994, estes produtos foram rapidamente adotados também pelos agricultores do Canadá, México e Argentina, em função das promessas de aumento da rentabilidade das colheitas anunciadas pela Monsanto (redução dos custos de produção em torno de 10%). A superfície cultivada com OGM no mundo, em 1998, foi estimada em aproximadamente 30 milhões de hectares, dos quais 74% nos EUA. Apesar de a difusão dos OGM ter sido a mais intensa entre os produtores de soja nos EUA e na Argentina, o Brasil (segundo maior produtor mundial de soja) manteve-se à margem deste processo, até o momento.
As promessas de obtenção de uma rentabilidade maior, com o cultivo dos transgênicos, despertaram o interesse de agricultores brasileiros, que se encontram, em sua maioria, em uma situação financeira precária, devido à drástica redução, ou mesmo eliminação, dos subsídios agrícolas. Para o governo, a possibilidade de aumentar a competitividade da agricultura brasileira no cenário internacional, por intermédio do uso de sementes transgênicas, apresenta-se como um argumento incontestável em um momento no qual o país necessita equilibrar urgentemente a sua balança comercial.
Apesar desse contexto econômico e político favorável à adoção dos transgênicos, o processo de aprovação destes produtos (particularmente da semente Roundup Ready da Monsanto) sofreu um revés inusitado. O bloqueio judicial à decisão governamental favorável à comercialização da “RR” revelou a presença de uma resistência social bem articulada em torno de organizações não-governamentais de ambientalistas, de defesa de consumidores e de assessoria e apoio a agricultores familiares e suas associações. A resistência aos transgênicos ganhou ainda mais força com a decisão oficial do governo do Rio Grande do Sul de proibir o plantio deste tipo de produto naquele estado.
O objetivo deste artigo é justamente analisar os fatores que limitam o processo de difusão dos OGM no Brasil. Procurar-se-á mostrar que o processo de difusão dos transgênicos no país caracteriza-se essencialmente por um embate entre as estratégias de ação das empresas sementeiras (em particular a Monsanto), na valorização e apropriação de seu capital, e a resistência de atores sociais ligados à sociedade civil. No que se refere aos agricultores familiares, a “idéia-força” que sustenta esta resistência é sua autonomia, além da possibilidade de uma melhor inserção em segmentos dos mercados mundiais.
O referencial analítico adotado parte de uma abordagem dinâmica do processo de difusão tecnológica sugerida por Rosemberg (1979), que considera a importância das especificidades institucionais de cada país como uma variável explicativa fundamental ao fenômeno da difusão. Outro aspecto que se associa diretamente ao processo analisado é a apropriabilidade do conhecimento, determinada pela capacidade da firma em gerir certos ativos complementares, necessários ao desenvolvimento, à aprovação e à comercialização de seus conhecimentos. Tais elementos de análise são brevemente apresentados na primeira seção deste trabalho, como uma abordagem alternativa à visão neoclássica que considera exclusivamente as variáveis econômicas baseadas na maximização dos rendimentos. A segunda seção trata das estratégias de diversificação das empresas no ramo dos OGM, particularmente da Monsanto, a qual revela uma capacidade de gestão dos altos riscos inerentes à transformação de conhecimentos científicos, ligados à engenharia genética, em produtos comercializáveis. A terceira e a quarta seçôes abordam os aspectos institucionais (sociais e políticos) que têm limitado a difusão dos OGM no Brasil. A terceira seção apresenta as origens da resistência social a esta difusão e como ela evolui. Procura-se identificar na montagem do aparato normativo relacionado aos transgênicos (lei de propriedade intelectual, lei de cultivares, biossegurança) a convergência existente entre a indústria de sementes e o governo federal. A quarta seção resgata o papel de resistência social desempenhado pelo governo do Rio Grande do Sul,[1] tornando-se um importante protagonista no jogo de forças que se estabelece em torno da autorização dos OGM no Brasil. Ao longo dessas duas últimas seções procura-se, enfim, ressaltar a polarização de forças existente entre a indústria de sementes e os agricultores na apropriação do conhecimento e mostrar que o resultado do embate permanece indefinido por uma decisão judicial que suspendeu temporariamente a comercialização dos OGM no Brasil.
Difusão e apropriação da tecnologia
O esforço de compreensão teórica da corrente neoclássica no que tange ao processo de difusão da tecnologia tem como um de seus principais referenciais o texto de Mansfield (1979) “El cambio técnico y la tasa de imitación”. Neste artigo, o autor procura, mediante uma análise empírica do processo de difusão de inovações entre empresas, em quatro diferentes ramos industriais, estabelecer os parâmetros que determinam o ritmo de adoção de novas tecnologias. No modelo proposto por Mansfield a taxa de difusão é determinada fundamentalmente pela expectativa de rentabilidade gerada pelas novas tecnologias, pelo montante dos investimentos necessários e pela proporção das empresas que já utilizam as mesmas.
Compatível com este referencial analítico de maximização dos rendimentos, Griliches (1979) já havia realizado nos anos 50 um dos primeiros estudos sobre o processo de difusão do milho híbrido nos EUA.[2] As conclusões do estudo corroboraram a hipótese de que a velocidade de adoção do novo produto pelos agricultores estava diretamente ligada à rentabilidade obtida, assim como disponibilidade de variedades adaptadas às diferentes regiões do país. O autor também sugere que a taxa de adoção das novas sementes era maior entre os agricultores mais tecnificados (áreas “boas”), os quais conseguiam obter uma rentabilidade mais elevada do que os menos tecnificados (áreas “más”), sem, no entanto, discutir as causas da interação entre as variáveis técnicas e econômicas.
Já Rosemberg (1979), seguindo a linha neo-schumpeteriana de análise do progresso técnico, critica a insuficiência do modelo neoclássico de difusão tecnológica, indicando a necessidade de incorporar novos elementos explicativos ao processo de difusão para uma análise dinâmica do fenômeno. O autor chama a atenção para uma série de características intrínsecas ao processo de difusão, o qual depende basicamente da interação das seguintes variáveis: continuidade da atividade inventiva; aperfeiçoamento das novas técnicas; desenvolvimento de habilidades entre os usuários (learning-by-using); desenvolvimento de habilidades na fabricação (learning-by-doing); aperfeiçoamento das velhas técnicas; especificidades das instituições em cada país.
As variáveis de análise propostas por Rosemberg enriquecem a discussão em torno do fenômeno da difusão tecnológica ao considerar a complexidade inerente da interação de fatores técnicos, econômicos, políticos, sociais e cognitivos que interferem no processo de adoção de novas técnicas pelos agentes produtivos. Entre todas essas variáveis um outro fator importante não abordado então por Rosemberg –e central no nosso objeto de estudo– é a questão da apropriação do conhecimento. No modelo neoclássico a propriedade intelectual é tida como uma externalidade, na medida em que existe o pressuposto de que qualquer tecnologia pode ser adquirida por todos aqueles que assim o desejem, independente de sua capacidade técnica ou econômica de assimilar novos conhecimentos. O próprio Mansfield (1979: 287) tem o cuidado de excluir de seu modelo determinístico as situações nas quais o processo de imitação foi limitado pela existência de patentes. Apesar de não ser, em geral, incorporada nos modelos neoclássicos de análise da difusão tecnológica, a apropriação dos frutos do progresso técnico é reconhecida como um fato inerente ao sistema capitalista o qual limita a alocação ótima dos recursos (Arrow, 1979).
A questão da apropriação é bem problematizada por Teece (1986) ao propor uma taxonomia que considera regimes de apropriação com diferentes graus de intensidade em função dos mecanismos de apropriação existentes (patentes, segredos), dos ativos complementares controlados pelas empresas, bem como das especificidades dos conhecimentos envolvidos. A incorporação do conceito de ativos complementares ligados aos aspectos de P&D, produtivos, comerciais, normativos etc., da nova tecnologia amplia a análise da apropriação do conhecimento, antes limitada aos aspectos legais e de segredo da propriedade intelectual. Neste caso, a apropriação dos frutos do progresso técnico perde o seu caráter de controle estático do conhecimento, através de segredos ou patentes, para adquirir um caráter mais dinâmico. Parte-se, assim, da premissa de que o conhecimento está em constante transformação, seja através da cumulatividade de experiências, seja através da substituição de antigas por novas idéias. Dentro desta dinâmica, a apropriabilidade do conhecimento estaria mais na capacidade de identificar, selecionar e interpretar o potencial de desenvolvimento tecnológico e aplicação comercial de um conjunto de idéias –complementares ou concorrentes– geradas ao longo do tempo. Na realidade, patentes e segredos podem retardar, ou mesmo alterar a direção e o ritmo da difusão do progresso técnico, mas não impedi-la. A questão não é apenas de saber produzir novos conhecimentos, mas de saber comercializá-los de acordo com as diferentes especificidades dos mercados e da própria concorrência. A empresa inovadora deve ser capaz de gerir os riscos inerentes ao processo de inovação, caracterizados não somente pela incerteza dos resultados, como também pela possibilidade da difusão dos conhecimentos entre os seus concorrentes e usuários. Dito de outra forma, a questão principal passa a ser, portanto, a de como conciliar a difusão da nova tecnologia, garantindo-se ao mesmo tempo a apropriação do seu conhecimento. É justamente neste ponto que a proposta analítica de Teece revela-se importante. Como veremos, ao identificar as estratégias de crescimento das empresas no ramo das sementes transgênicas, o processo de difusão deste tipo de produto baseia-se na gestão de uma série de ativos complementares que envolvem desde a influência sobre o parecer da comunidade científica e sobre as decisões das instituições responsáveis pela regulamentação de novos produtos alimentares, até a participação majoritária no mercado mundial de sementes.
A nossa análise do potencial de difusão dos OGM tem, portanto, um caráter dinâmico que extrapola a abordagem neoclássica baseada nos resultados econômicos obtidos a partir da nova tecnologia. O que interessa é justamente considerar o processo pelo qual o progresso técnico é concebido e proposto pelas empresas e assimilado pela sociedade. Interessa-nos em especial analisar as resistências sociais à difusão dos OGM como um fenômeno associado às especificidades institucionais (culturais, políticas, sociais) de cada país ou região.
As estratégias de diversificação da empresas no ramo dos OGM
A década de 90 caracteriza-se como um período marcante de mobilidade de capitais de empresas tradicionalmente implantadas nos ramos químico e farmacêutico para o ramo de sementes, voltadas particularmente ao desenvolvimento de OGM. Atualmente cinco empresas controlam quase a totalidade da produção de sementes transgênicas no mundo (Monsanto, Novartis, AstraZeneca, Aventis e DuPont). A Monsanto tornou-se a pioneira neste segmento de mercado ao desenvolver uma linha de sementes transgênicas, com destaque para a Roundup Ready, uma semente de soja com maior resistência ao principal produto da empresa, o herbicida Roundup. A entrada deste grupo industrial no campo da engenharia genética pode ser percebida como uma estratégia de valorização de seu principal ativo (Roundup), em um ambiente competitivo marcado por constantes inovações de produtos, com normas ambientais cada vez mais rígidas e com o prazo de expiração da patente marcado para o ano 2000. A empresa se vê assim em face de um problema de valorizar o capital investido e de, ao mesmo tempo, mobilizá-lo na direção de atividades mais rentáveis e compatíveis com as novas regras institucionais. Surgem daí duas questões que nos parecem fundamentais para resgatar historicamente as estratégias de diversificação da Monsanto: como prolongar a valorização de seu principal ativo (Roundup) de forma a induzir os agricultores a aumentar o uso de seu herbicida, em um momento no qual as normas ambientais tornam-se cada vez mais rígidas, impondo a redução do uso de agrotóxicos? Como garantir a fidelidade dos agricultores à marca de seu produto de modo a valorizar ainda mais o seu principal ativo? A complementaridade da produção de sementes geneticamente modificadas, que produzam certas toxinas ou que sejam capazes de resistir ao herbicida, parece a solução ideal ao problema. O investimento da Monsanto na engenharia genética insere-se bem em uma perspectiva que, apesar das aparências, não se desvia, em princípio, de sua base tecnológica de origem que é a química industrial.
Pelaez e Poncet (1998) analisam a trajetória de diversificação da Monsanto neste novo ramo de atividade, identificando três períodos consecutivos nos quais a empresa estabelece uma acumulação de competências compatível com uma gestão gradual dos riscos envolvidos no empreendimento. Tais períodos são descritos a seguir.
Com o desenvolvimento de pesquisas em biologia molecular no setor público, a partir dos anos 60, a Monsanto inicia o recrutamento de pesquisadores capazes de estabelecer um intercâmbio com o meio acadêmico e as instituições de pesquisa do governo. Trata-se de uma estratégia prudente do grupo, do pon-to de vista financeiro, de inserir-se no novo campo de pesquisas, criando para si mecanismos de transferência de conhecimentos. Esta primeira etapa é marcada pelo desenvolvimento de uma estratégia de vigília científica e tecnológica.
O desenvolvimento pelo grupo de um organismo geneticamente modificado, resistente ao Roundup, constitui o ponto de partida de uma segunda etapa, na primeira metade dos anos 80, ligada à reprodução deste organismo e à experimentação in vivo de suas propriedades. Esta fase de desenvolvimento caracteriza-se pela formação de acordos de cooperação da Monsanto com universidades e empresas especializadas no ramo da engenharia genética, a saber:
acordo com a Mycogen para o desenvolvimento de produtos microbianos associando os biopesticidas com técnicas de microencapsulação;
participação financeira da Monsanto (US$ 1 milhão) no programa de pesquisa da Ecogen sobre o código genético de proteínas inseticidas;
acordo com a Plant Genetics para melhoramento varietal de sementes de batata utilizando técnicas de engenharia genética (Eurostaf, 1989).
O terceiro período (anos 90) é marcado pela autorização de comercialização dos produtos geneticamente modificados pela firma. Inicia-se uma nova fase de diversificação industrial na produção e comercialização de sementes. Surge, então, um engajamento financeiro bilionário visando o controle dos canais de distribuição de sementes em nível internacional, seja pelo controle acionário, seja pela absorção das principais empresas do ramo. Entre as operações de integração realizadas pela Monsanto no ramo de sementes destacam-se:
1995 – Aquisição de 49,9% das ações da Calgene, empresa produtora de sementes geneticamente modificadas de algodão e tomate.
1996 – Aquisição da Asgrow Seed Co., produtora de sementes de soja e algodão resistentes ao Roundup.
1997 – Acordo para a aquisição da Delta & Pine Land Co., empresa produtora de sementes de algodão.
1997 – Aumento da participação acionária na Calgene para 54,6%.
1997 – Aquisição da Dekalb Genetics, empresa especializada no melhoramento genético de vegetais (soja, sorgo, girassol) e na produção de herbicidas seletivos e biopesticidas.
1998 – Aquisição da divisão mundial de sementes da Cargill (Monsanto, 1998).
1998 – Aquisição da unidade de produção de sementes da Anglo Dutch Unilever, principal fornecedora de sementes de trigo de inverno resistentes à geada da Europa (Bloomberg News, 16/7/98).
Essas aquisições envolveram investimentos da ordem de 7 bilhões de dólares (Branco, 1998). A participação progressiva da Monsanto no ramo de sementes –adotando uma estratégia de crescimento externo– tem levado o grupo a consolidar-se como um dos maiores produtores em nível mundial, com destaque para a produção de sementes geneticamente modificadas. O retrospecto histórico da inserção da Monsanto na produção de OGM revela uma estratégia de gestão dos altos riscos inerentes à transformação dos conhecimentos associados à pesquisa fundamental em produtos comercializáveis. Essa estratégia caracterizou-se por uma inserção gradual do grupo neste tipo de atividade (monitoramento científico-técnico, acordos de P&D, acordos comerciais, absorção de empresas), com o objetivo de minimizar os riscos de ordem financeira necessários à geração e à apropriação dos novos conhecimentos. Cabe ressaltar que essa estratégia de crescimento externo concretizou-se somente com o advento das primeiras autorizações de comercialização das sementes geneticamente modificadas, concedidas principalmente a partir de 1995 pelo Food and Drug Administration – órgão oficial responsável pela regulamentação deste tipo de produto nos EUA. O Quadro 1 indica que, das treze autorizações concedidas pelo FDA até 1996, seis correspondiam a produtos da Monsanto, incluindo o da Calgene. Em outras palavras, a Monsanto aguardou prudentemente a autorização oficial de venda de seus produtos antes de concluir os seus investimentos de expansão no ramo de sementes.
A inserção da Monsanto no campo da engenharia genética revela-se, portanto, como um processo de acumulação e de gestão de ativos complementares na medida em que a firma supera gradativamente as etapas inerentes ao processo de inovação e, conseqüentemente, as incertezas a elas relacionadas. Vencidas as primeiras etapas concernentes ao desenvolvimento tecnológico, a etapa seguinte refere-se à aprovação oficial dos produtos. Nesta etapa, a imagem de respeitabilidade construída pelo FDA na análise e aprovação dos medicamentos e alimentos vendidos nos EUA é tida como uma referência mundial. Os procedimentos de avaliação e de conduta do FDA têm sido, no entanto, contestados principalmente no que tange à autorização das substâncias alimentares. No caso da manipulação genética de alimentos, Ferrara (1999) chama a atenção para uma série de denúncias realizadas nos EUA sobre a omissão das autoridades públicas na regulamentação mais severa deste tipo de substância. A autora cita, por exemplo, a existência de uma diretiva de 1992 do FDA que permite às empresas comercializarem livremente alimentos transgênicos sem a necessidade de qualquer teste de inocuidade ou autorização oficial. Ao mesmo tempo, os próprios grandes grupos agroalimentares influenciam muitas vezes a definição de regras de avaliação toxicológica mais rígidas. Como observa Ferrara (1999: 39) “a exigência de uma série de testes científicos de inocuidade de novos produtos tende a eliminar da concorrência as empresas agroalimentares mais modestas, gerando a ilusão na opinião pública de que os OGM são submetidos a testes rigorosos que garantem a sua inocuidade.” O próprio diretor operacional da Monsanto, Hendrik Verfaillie, declara: “... temos de conseguir uma aceitação à biotecnologia mediante um controle mais rígido porque é uma questão emocional que visivelmente afeta os investidores.” (Bloomberg News, 31/8/99).
Com regras de avaliação mais rígidas, os dados fornecidos pelas grandes empresas poderiam assim ser mais facilmente manipulados a fim de satisfazer as exigências dos órgãos públicos de controle. A autora cita, por exemplo, uma série de denúncias realizadas por cientistas independentes e por um funcionário do próprio FDA quanto aos procedimentos irregulares na apresentação e avaliação dos testes do HCBr, o hormônio bovino de crescimento produzido pela Monsanto. As denúncias envolvem desde a manipulação dos dados apresentados pela empresa até o encobertamento dos resultados pelo FDA. Isto ocorre, segundo o artigo de Ferrara (1999), tanto em função da incompetência dos técnicos na verificação dos testes, quanto do nepotismo presente na instituição com a contratação de antigos funcionários da Monsanto, os quais participavam diretamente na verificação dos testes apresentados pelo seu antigo empregador. Este tipo de procedimento irregular, ou mesmo não ético, da Monsanto revela-se no caso da formação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) no Brasil. Entre os seus membros estão presentes os representantes das empresas diretamente interessadas (como a Monsanto) nas decisões relativas à aprovação dos OGM no país.
Mais do que um procedimento puramente científico que diz respeito a decisões sobre a saúde pública, a presença dessas empresas em câmaras técnicas de avaliação acaba por influenciar o parecer da comunidade científica. Isto ocorre muitas vezes tanto em função da maior competência dos cientistas das próprias empresas –mais familiarizados com as técnicas e os procedimentos de análise dos produtos– quanto pelo envolvimento financeiro da própria comunidade científica nas pesquisas subvencionadas pelas mesmas empresas. Nesse último caso, as empresas fazem uso do prestígio de certas instituições e cientistas como forma de acelerar a aceitação de seus produtos junto ao público consumidor. Tal estratégia é atualmente adotada com prioridade pela Monsanto que busca o apoio de cientistas, médicos e educadores para transmitir a noção de segurança dos alimentos produzidos pela engenharia genética. O próprio Verfaillie explicita essa busca de apoio científico aos OGM anunciando: “...traremos cientistas com credibilidade consolidada para falar em nome da ciência.” (Bloomberg News, 31/8/99).
Nos EUA, o processo de aprovação dos OGM mostrou-se ágil e pouco controvertido, viabilizando a rápida aceitação dos agricultores e consumidores norte-americanos. Vencida esta etapa de incerteza, a Monsanto pôde finalmente engajar-se em investimentos muito mais expressivos de participação direta no mercado mundial de sementes. Tais investimentos basearam-se em uma aposta, por parte da direção da empresa, na rápida difusão dos OGM em nível mundial, substituindo radicalmente as sementes produzidas com base em técnicas convencionais de melhoramento. Para tanto, a Monsanto investiu maciçamente na aquisição de grandes empresas sementeiras, transformando-se em um dos líderes mundiais de mercado. Os resultados desse empreendimento fizeram-se sentir rapidamente. As estimativas da American Soybean Association indicam uma evolução da área cultivada com soja transgênica nos EUA de 1%, em 1996, para 48%, em 1999. No caso do milho transgênico, os valores seriam de 0,7% para 30%, ao passo que para o algodão transgênico, de 2,3% para 8% (La Rotta, 1999). No Canadá, 51% da área cultivada com canola, milho e soja, na safra deste ano, deverão ser com sementes transgênicas (La Rotta, 1999). Já na Argentina, terceiro produtor mundial de soja, a área cultivada com sementes transgênicas desta leguminosa era estimada, em abril de 1999, em quase 75% do total (Torriglia et al, 1999). Estimativas mais recentes, de novembro de 1999, indicam uma participação da área cultivada de mais de 80% do total para a safra deste ano (Torriglia, 1999). No caso do Brasil, segundo produtor mundial de soja, este fenômeno não ocorreu ainda, devido às ações judiciais desencadeadas por entidades ligadas à sociedade civil que impediram a execução da aprovação de alguns produtos transgênicos pela CTNBio, como será visto mais adiante. No entanto, a Monsanto, antecipando-se ao processo de aprovação de suas sementes transgênicas no Brasil, desencadeou uma série de aquisições de empresas sementeiras no país, detendo, a partir de 1997, o primeiro lugar no mercado de sementes de milho, com 60% da produção, e o segundo lugar no de soja, com cerca de 20% do mercado (Zanatta e Cardona, 1999).[3]
Outra forma de pressionar a autorização dos transgênicos no Brasil se dá pelo potencial de investimento de grandes empresas multinacionais, como a Monsanto. Com todas as facilidades propiciadas pela guerra fiscal entre os estados da federação, a Monsanto iniciou em janeiro deste ano a construção de uma unidade de produção do Roundup na Bahia, anunciando investimentos da ordem de US$ 550 milhões (Folha de São Paulo, 14/1/00). A atração de capital estrangeiro para a atividade industrial transforma-se no maior trunfo político em um país cuja política econômica liberal tem reduzido as alternativas de expansão do parque industrial interno. A sinergia de interesses entre capital privado e governo federal garante assim à Monsanto um importante aliado no processo de autorização para a comercialização dos transgênicos no Brasil, como será visto na próxima seção.
Quadro 1. Caraterísticas e data de aprovação dos produtos geneticamente modificados desenvolvidos nos EUA.
Produto
Firma
Características
Nome Comercial
Ano de
aprovaçãoMilho
Ciba
Proteção contra insetos
Maximizer
1995
Milho
Mycogen
Proteção contra insetos
Nature Gard
1995
Milho
Sandoz/
NorthrupProteção contra insetos
-
1995
Algodão
Calgene/
Rhône PoulencResistência a herbicida
BXN Cotton
1995
Algodão
Monsanto
Proteção contra insetos
Bollgard
1995
Algodão
Monsanto
Resistência a herbicida
Roundup Ready
1996
Batata
Monsanto
Proteção contra insetos
New Leaf
1995
Soja
Monsanto
Resistência a herbicida
Roundup Ready
1995
Tomate
Agritopa
Retarda alteração
-
1996
Tomate
Calgene
Retarda alteração
Flavr Savr
1994
Tomate
DNA Plant
TechnologyRetarda alteração
Endless Summer
1995
Tomate
Monsanto
Retarda alteração
-
1995
Tomate
Zeneca/
Peto SeedRetarda alteração
-
1995
Fonte: Agribusiness, dezembro, 1996.
As origens da resistência à difusão dos transgênicos no Brasil
As ações judiciais impetradas pela Idec e pelo Greenpeace podem dar a idéia de que a resistência aos OGM no Brasil tenha surgido de forma repentina e partido mais de organizações urbanas ligadas a consumidores e ambientalistas. Nesta seção, procura-se trabalhar as origens dessa resistência, recuperando-se alguns de seus importantes atores. Acredita-se que ela representa uma continuidade de um processo, iniciado no final dos anos 70, de questionamento do modelo agrícola adotado no país e de combate às regulamentações que são favoráveis às indústrias internacionais fornecedoras de insumos, máquinas e equipamentos. Reforça esta idéia um depoimento do diretor de regulamentação da Monsanto, Luiz Abramides do Val, à Folha de São Paulo, publicado no dia 9/3/99. Com respeito à proibição do plantio de produtos transgênicos no Rio Grande do Sul, ele declarou: “é uma medida ideológica. O governo gaúcho (do Rio Grande do Sul) é de esquerda e está ligado às organizações não-governamentais que associam a biotecnologia ao poderio das grandes empresas multinacionais.” Toma-se esta declaração como um ponto de partida para que se explique os motivos dessa proibição pelas autoridades gaúchas. Como procuraremos ilustrar, tal decisão é reflexo de um longo processo de discussão no seio de um movimento, o de “agricultura alternativa”. Este movimento criticou e combateu o modelo de desenvolvimento agrícola adotado no Brasil e, no que interessa mais diretamente este artigo, a dependência dos agricultores em relação às sementes.
Nosso intuito é mostrar que diante da estratégia de apropriação da Monsanto está colocada outra, também de apropriação (de material genético e de conhecimentos), dos agricultores familiares, por meio de suas próprias organizações ou de instituições de assessoria e apoio (ONG).
A autonomia do agricultor como “idéia-força”
Segundo Almeida (1999), na metade do anos 70, na região Sul do Brasil, vão nascer (ou ressurgir), com basem em uma idéia central, diversas associações, grupos e organizações não-governamentais de apoio aos agricultores. Essa idéia central é a necessidade de preservar uma certa categoria social e produtiva: o agricultor familiar e, por conseqüência, “a necessidade de reorientar os sistemas produtivos e as tecnologias empregadas na direção de um reforço na capacidade econômica e de autonomia dessa categoria” (Almeida, 1999: 58; grifos nossos). O mesmo autor também destaca como este conceito de autonomia vai ser uma das idéias principais do conjunto de concepções e práticas da “agricultura alternativa”.
Ehlers (1996), retraçando as origens deste movimento, lembra a importância da ação de um grupo na Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado de São Paulo, a partir de 1977, que questionava o modelo de agricultura adotado pelo país e propunha alternativas. É importante ressaltar a repercussão nacional –especialmente junto a agrônomos e estudantes de agronomia– que este grupo conseguiu dar a suas posições, através do Jornal do Engenheiro Agrônomo.
Mais tarde viriam os Encontros Brasileiros de Agricultura Alternativa – EBAA (I – 1981, II – 1984, III – 1987, IV – 1988), organizados pela Federação das Associações de Engenheiros Agrônomos do Brasil (Faeab) e por ONG, (especialmente naquele período, o PTA-FASE, depois a AS-PTA).[4]
Um dos pontos centrais nos debates destes encontros era a dependência gerada pelos insumos produzidos pela indústria e, entre eles, o papel estratégico das sementes. Assim, no II EBAA, John Wilkinson destacava:
Se pensarmos na indústria de insumos, não devemos restringir as análises à questão dos defensivos e herbicidas. Por que tem aumentado a necessidade de defensivos e herbicidas? Porque a indústria está progressivamente tomando conta da matéria-prima mesma da produção agrícola, que é a semente. O grande desafio que se nos apresenta é que, nestes últimos 20 anos, tem acontecido a apropriação de todo o circuito da produção agrícola pelo domínio da indústria de sementes pelas multinacionais. (II EBAA, 1984: 75-6)
Por isso e pela ameaça sobre a diversidade genética, Wilkinson considerava que na elaboração de uma política alternativa para a agricultura deveria se pensar, também, em uma lei que impedisse, no Brasil, a “monopolização” da produção de sementes e da pesquisa ligada a esta produção. Este mesmo conferencista já apontava para a capacidade que as firmas multinacionais teriam de manipular geneticamente a produção agrícola.
Já no III EBAA, uma das conferências mais concorridas foi a de Pat Roy Mooney, associada ao lançamento da edição brasileira[5] do seu livro Seeds of the earth – a private or public ressource?, de 1979. Na apresentação do conferencista, o representante da Faeab lembrou a tentativa feita, entre 1974 e 1977, pela International Plant Breeders (IPB) de fazer passar no Brasil, através da Abrasem (Associação Brasileira dos Produtores de Sementes), do Ministério da Agricultura e da Embrapa, uma lei de proteção de cultivares. A mobilização de resistência e o seu sucesso[6] seriam explicados, segundo a Faeab, por dois argumentos: “1. O receio, justificado, do domínio monopolizador das multinacionais no âmbito das sementes; 2. O encarecimento desses insumos, caso viesse a passar para o controle do setor privado” (III EBAA, 1987: 200).
No início de sua conferência, o professor Mooney ressaltava:
Se as sementes que estão sendo melhoradas necessitam de agroquímicos estão suscetíveis à doença e se tais sementes forem patenteadas e o mercado monopolizado, os agricultores não terão escolha. Com o desenvolvimento da biotecnologia e da engenharia genética, a concentração de tal indústria torna-se ainda mais intensa, porque o principal trabalho das que estão neste negócio é o desenvolvimento de variedades de plantas que resistem a herbicidas, variedades que irão sobreviver aos agroquímicos (III EBAA, 1987: 202; grifos nossos).
O objetivo não é discutir o mérito destes argumentos, assim como, dados os limites do artigo, não se pode descrever nem o contexto político, econômico e social brasileiro, nem as estratégias predominantes na indústria agroquímica. O fundamental é que se perceba que um grupo importante de técnicos estava sendo fortemente influenciado por uma análise crítica do poder crescente das grandes empresas agroindustriais de “montante”, especialmente as sementeiras, sobre a agricultura brasileira. São justamente estes técnicos que compõem ou vão reforçar os quadros das ONG. Técnicos cujo papel, como destaca Almeida (1999), revestia-se de um caráter político-ideológico acentuado e, secundariamente, técnico. No debate, a semente sempre aparece como um insumo estratégico. As ONG, em oposição à estratégia de apropriação adotada pelas grandes indústrias agroquímicas e de sementes, buscam desenvolver programas locais de produção de variedades “crioulas”, mais adaptadas às condições locais e, por isso, não exigindo insumos externos. Ao mesmo tempo, começam a perceber que era necessário fazer pressões para evitar que o país adotasse regulamentações favoráveis às estratégias daquelas empresas. Esses elementos são importantes para que se compreenda o fenômeno de resistência social que ocorre mais tarde aos transgênicos e que entenda porque, no Brasil, a resistência maior veio da agricultura familiar e de suas organizações e não dos consumidores, como ocorre na Europa. O que se procura mostrar é que a resistência aos transgênicos vai representar uma continuidade de “luta” para estes quadros das ONG: primeiro pelo controle dos agrotóxicos, depois contra a lei de cultivares, em seguida contra a lei de propriedade industrial e o patenteamento de seres vivos e, finalmente, contra os OGM.
No início da década de 1990, eles vão agir em duas frentes: a implantação de uma rede de organizações com o objetivo de “recuperar a autonomia dos agricultores em relação à produção de sementes” e a “luta” contra uma lei de propriedade industrial que permitiria o “patenteamento de seres vivos”.
A experiência da “Rede Milho”
Segundo Cordeiro e Mello (1994:19), a partir de 1990, as ONG da Rede PTA (ver nota 4) que atuam no Sul e no Sudeste do país –regiões onde o processo de modernização da agricultura foi mais intenso– definiram uma estratégia comum de trabalho. Os princípios básicos desta estratégia eram a valorização das variedades locais e a participação dos agricultores. Buscava-se, com eles, “soluções ao problema da dependência em matéria de sementes” (Cordeiro e Mello, 1994: 19).
A cultura do milho foi a escolhida para o início deste trabalho por ser uma das principais da agricultura brasileira e por estar presente na maioria das pequenas propriedades, sendo “uma porta de entrada privilegiada para discutir o sistema de produção como um todo” (Cordeiro e Mello,1994: 18). Um importante trabalho de resgate de variedades locais, de avaliação e de melhoramento destes materiais e de produção de sementes foi realizado. Buscou-se, depois, ampliar a “Rede Milho”, trabalhando-se com diversas espécies, inclusive de plantas autógamas, como o feijão e a soja. Ressalte-se que neste trabalho vão se destacar, no Rio Grande do Sul, os Centros de Apoio ao Pequeno Agricultor (Capa) e o Centro de Tecnologias Alternativas Populares (Cetap).
A lei de patentes
Em abril de 1991, o presidente da República enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei (PL 824) para uma nova regulamentação de patentes e marcas. O Brasil sofria naquele momento uma importante pressão do governo dos Estados Unidos para realizar mudanças, especialmente no que se referia ao patenteamento de produtos químicos, alimentares e farmacêuticos. O governo americano atendia, na realidade, às exigências de suas companhias transnacionais que clamavam por mudanças institucionais nos países “em desenvolvimento”, a fim de aí viabilizar a expansão de seus negócios. No que diz respeito às sementes, admitia-se, nesse projeto, patentes para processos de obtenção de vegetais, desde que não essencialmente biológicos (por engenharia genética, por exemplo), e, da mesma forma, o patenteamento de vegetais em si, desde que obtidos por processos artificiais. Além disso, no bojo deste debate dentro do governo, retomou força a proposta de criação de uma lei especial para proteção de espécies vegetais ou lei de proteção de cultivares.[7]
Considerando que essas duas leis eram prejudiciais não só a agricultores, cooperativas e empresas rurais, mas à sociedade como um todo, organizações da sociedade civil deram início a uma campanha contra estes projetos. Argumentavam com “...os riscos de oligopolização da indústria sementeira, com a conseqüente eliminação das empresas competitivas locais, a elevação do preço real da semente e a concentração das atividades de pesquisa na mão de empresas em geral mais interessadas em produtos lucrativos do que em bem estar social, desenvolvimento econômico e equilíbrio ambiental.” (Pessanha et al., 1993: 15). De novo, especialmente no Sul do Brasil, diversas ONG de assessoria e apoio a agricultores familiares e suas organizações desempenharam papel importante no debate e na mobilização contra a aprovação destes projetos. Mais uma vez, a apropriação de material vegetal e de conhecimentos pelos agricultores foi colocada no centro da argumentação. Apesar da pressão do governo sobre o Congresso, o processo de mobilização e debates impediu a aprovação imediata daquelas propostas e, logo em seguida, houve o impeachment do presidente Fernando Collor por forte envolvimento em esquemas de corrupção. Mas o embate foi retomado logo em seguida e, após várias tentativas do governo, no final de 1996, com o Executivo fortalecido pelo resultado de medidas econômicas (Plano Real), foi aprovada a nova lei de propriedade intelectual. Ela entrou em vigor a partir de maio de 1997. Um pouco antes, em abril de 1997, foi aprovada a lei de proteção de cultivares. Com a aprovação destas leis, estava definido um quadro normativo que permitia às empresas, segundo as condições que elas julgavam necessárias, a difusão das plantas transgênicas no país.
As ações da Monsanto para a difusão da soja “RR” no Brasil e o crescimento de uma inusitada resistência social
Foi dentro do quadro legal favorável às suas estratégias de apropriação do material vegetal que a Monsanto passou a realizar as ações necessárias para introduzir no Brasil o plantio comercial da sua soja transgênica “RR”. Um debate sobre as plantas transgênicas já ocorria no país desde 1996, mas estava restrito àquela parcela da comunidade científica mais diretamente ligada ao tema. A polêmica em torno do tema tornou-se mais acirrada com o pedido de autorização que a Monsanto fez, em junho de 1998, à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) para vender no país a Roundup Ready. Ressalte-se que a CTNBio, a quem cabe emitir parecer técnico sobre qualquer liberação de OGM no país, tem forte peso do governo em sua composição e está vinculada diretamente ao Ministério da Ciência e Tecnologia.[8] Pelos procedimentos desta Comissão, a sociedade brasileira tinha, no entanto, um mês para levantar questões sobre o assunto. Diversas entidades, entre elas a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC) e o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), se manifestaram contra a liberação. Neste período, atendendo a uma petição do Idec e de ambientalistas, foi concedida uma liminar pela Justiça Federal, em São Paulo, proibindo que a soja transgênica fosse cultivada antes da realização de um estudo do impacto ambiental. Mesmo com esta liminar e com as reações da sociedade, a CTNBio aprovou, em 24 de setembro, a demanda da Monsanto. Segundo noticiou o jornal O Estado de São Paulo, “... por 13 votos a favor, 1 contra e 1 abstenção, os especialistas entenderam que o alimento geneticamente modificado não oferece riscos ao ambiente nem à saúde...” (Weber, 1998). Para o presidente da Comissão, enquanto a liminar estivesse valendo, o plantio comercial não poderia ser feito e, no tocante ao governo, a questão passaria, então, a ser analisada pelo Ministério da Agricultura. Este deveria decidir sobre a autorização para que a Monsanto vendesse o produto. O debate chegou, então, ao Congresso, mais especificamente à sua Comissão de Meio Ambiente. Deputados de oposição, alertados por ONG, estranharam uma coincidência: uma portaria da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária propondo o aumento de resíduos do herbicida Roundup de 0,2 ppm para 20 ppm na produção de soja transgênica havia sido assinada exatamente no mesmo dia em que a CTNBio liberou o plantio da soja “RR”.
O que se pode constatar, neste caso, são sinais claros da existência de um lobby intenso e articulado da Monsanto junto às diversas instâncias de regulamentação relacionadas à sua soja transgênica assim como uma clara posição “colaboracionista” por parte do governo federal. Apesar disso, como a Monsanto não conseguiu cassar a liminar judicial então em vigor, o período de plantio da soja para a safra 98/99 passou sem que o cultivo comercial da “RR” pudesse ser legalmente realizado. Isso não impediu, no entanto, o plantio da “RR” no Brasil, feito principalmente com sementes contrabandeadas da Argentina.[9]
O papel de resistência desempenhado pelo governo do Rio Grande do Sul
Com as eleições de 1998, o Partido dos Trabalhadores assume, a partir de janeiro de 1999, o Executivo do Rio Grande do Sul e amplia sua representação na Assembléia Legislativa do estado. Parte desta vitória pode ser explicada pelo apoio e pelo voto de importantes segmentos ligados à agricultura familiar. Com isso, assessorias parlamentares e postos-chave nas instituições públicas ligadas à agricultura e ao desenvolvimento rural passam a ser ocupados por pessoas relacionadas de longa data com o movimento de fortalecimento da agricultura familiar e com propostas técnicas “alternativas”, melhor definidas como agroecológicas. Destaque-se, entre essas pessoas da sociedade civil recrutadas pela “máquina pública”, os técnicos ligados às ONG articuladas na Rede Tecnologias Alternativas (TA-Sul), em especial ao Cetap e ao Capa. Como foi visto, uma das “idéias-força” destas ONG é a autonomia do agricultor, sendo o material vegetal (semente) considerado como estratégico para o modelo de desenvolvimento.
Já em março de 1999, uma iniciativa no Legislativo, explicitamente apoiada pelo Executivo, buscou transformar o Rio Grande do Sul em “estado livre de transgênicos”. O deputado Elvino Gass, do PT, apresentou projeto de lei propondo a proibição do cultivo comercial e da venda de produtos geneticamente modificados destinados à alimentação humana ou de animais. A Secretaria da Agricultura do Estado apoiava esta iniciativa, justificando-a pela preservação da saúde pública e pela possibilidade de ampliação das exportações da soja produzida no Rio Grande do Sul para o mercado europeu. Como é sabido, este estado vem perdendo importância no complexo soja, produzindo[10], hoje, 22% da soja brasileira (ver nota 1). Nas mesmas condições de uma agricultura do tipo industrial, o Rio Grande do Sul perde em competitividade para as produções do Centro-oeste do país e, com isso, houve um importante deslocamento de produtores e empresas agroindustriais para aquela região. É interessante registrar que grupos agroindustriais importantes instalados no Rio Grande do Sul –como o Ceval/Bung– manifestaram seu apoio a esta iniciativa do governo, apostando na segmentação do mercado e nas possibilidades dos mercados japonês e europeu.
De fato, esta iniciativa do Rio Grande do Sul reacendeu a polêmica. Diversas propostas de projeto de lei apareceram nos Legislativos estaduais. Seminários sobre o tema, com boa participação da sociedade civil, passaram a ser realizados em todas as regiões do sul do Brasil (sempre com a importante participação das ONG que assessoram a agricultura familiar). Ao mesmo tempo, o governo federal renovou e reforçou o seu apoio à Monsanto.
No início, a posição do governo pareceu dividida, quando o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), ligado ao Ministério do Meio Ambiente, solicitou ao juiz da 6a. Vara da Justiça Federal de Brasília sua inclusão como parte interessada em ação cautelar movida pelo Greenpeace e pelo Idec. Entre os argumentos usados pelo Ibama para aderir à ação, estava a decisão da CTNBio de não cobrar da Monsanto do Brasil o EIA-Rima (estudo e relatório de impacto ambiental) para aprovação comercial da soja transgênica no país. Entretanto, a Presidência da República centralizou, logo em seguida, a intervenção do governo federal sobre a liberação do plantio comercial da soja transgênica, através de uma coordenação especialmente montada. Com isso, a Advocacia Geral da União (AGU) contestou na Justiça Federal do Distrito Federal aquela decisão do Ibama. Para os consultores da AGU, o Ibama não poderia se posicionar contra o governo e deveria ter assumido o papel de réu solidário no processo.
Em seguida, o ministro da Agricultura declarou que seu Ministério “...deverá aprovar o registro da soja transgênica tão logo a Monsanto do Brasil apresente o pedido ao Serviço Nacional de Proteção de Cultivares.” (cf. Rural Business, 18/3/99).
Mais tarde, o ministro da Ciência e Tecnologia reafirmou que a decisão da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) –autorizando o plantio de soja transgênica no país– era “...a mesma posição do Governo...”. Para ele, “...a decisão da CTNBio é definitiva, e não há mais o que se discutir a respeito.” (Rural Business, 19/4/99).
Neste quadro institucional favorável, a Monsanto apresenta, em 5 de maio, ao Serviço Nacional de Proteção de Cultivares (SNPC), o pedido de proteção e registro de cinco variedades de soja transgênica desenvolvidas pela sua divisão “Monsoy”. O Ministério da Agricultura comunica, 10 dias depois, a aprovação dos registros. Segundo o jornal Zero Hora (15/5/99), de Porto Alegre, a informação “...surpreendeu até a própria multinacional, que não tinha previsão de receber uma resposta logo.” A Monsoy vinha encaminhando a Delegacias do Ministério de Agricultura nos estados consultas para importar da Argentina e do México sementes de soja “RR”. As ONG consideravam que este pedido era parte da estratégia para pressionar as autoridades gaúchas a aceitarem os transgênicos.
O anúncio do Ministério da Agricultura gerou uma sucessão de ações judiciais e, no Rio Grande do Sul, o governo informou que, diante da liberação, adotaria uma “moratória agrícola”. Ou seja, durante cinco anos, por meio de decreto a ser assinado pelo governador, proibiria o ingresso das sementes no Estado. O governo federal, em face da ampliação da reação da sociedade, passou a propor que os OGM fossem rotulados e estruturou um grupo de trabalho para estabelecer regras neste sentido.
O jogo de forças, que pendia favoravelmente à Monsanto e ao governo federal, se alterou de forma repentina, quando, em 18 de junho, um juiz da 6a. Vara de Justiça Federal concedeu liminar proibindo o plantio e a comercialização da soja “RR” até que sejam realizados estudos de impacto ambiental e criadas normas de rotulagem. A Monsanto também ficou proibida de cultivar a soja em escala comercial. A ação foi movida pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) e pelo Greenpeace. O governo federal e a Monsanto recorreram logo em seguida da decisão. Mas a empresa já se via perante um novo “impasse judicial” que retardava, mais uma vez, a difusão de seus OGM no Brasil.
No dia 13 de julho, o presidente do Tribunal Regional Federal indeferiu pedido da Monsanto do Brasil para a suspensão dos efeitos da decisão (liminar) do juiz da 6a. Vara, considerando que a questão, por ser “polêmica” e de “grande relevância”, fosse “...apreciada de forma abrangente e definitiva, possibilitando a todas as partes envolvidas maior segurança no que toca ao deslinde de questão tão importante não só para elas, mas também para toda a população brasileira, consumidores potenciais da soja transgênica roundup ready.” Em 12 de agosto, o mesmo juiz da 6a. Vara de Justiça Federal confirmou o mérito da decisão por ele tomada em junho. Pelos trâmites da justiça brasileira estavam, na prática, inviabilizados os planos da Monsanto de vender sementes transgênicas na safra 1999/2000.
Setores favoráveis aos transgênicos passaram, então, a ver no contrabando de sementes da Argentina a principal forma de mostrar que o processo de adoção da soja RR pelos agricultores era “irreversível”. O próprio presidente da Associação Brasileira de Produtores de Sementes (Abrasem) anunciaria que um milhão de hectares (ou um terço da área cultivada com soja no Rio Grande do Sul) deveriam ser plantados com soja transgênica na safra 1999/2000[11] (cf. Zero Hora, 2/9/99). O governo do estado estava lançando, naquele momento, uma campanha significativa na mídia (“transgênicos: não plante essa idéia!”). No lançamento da campanha, o secretário da Agricultura declarou: “...os agricultores não podem ficar escravos na compra de sementes de uma única multinacional.” Quanto ao contrabando, o secretário afirmou que o estado faria tudo para localizar e destruir as lavouras com transgênicos (Jornal do Brasil, 2/9/99).
A ação do governo do Rio Grande do Sul no que tange aos transgênicos gerou, entre as partes interessadas, um cenário de disputa construído nas diferentes instâncias públicas, a saber: fiscalização intensa pelos órgãos do governo estadual; impedimento à ação dos fiscais por parte de alguns sindicatos rurais (patronais) de regiões onde o plantio de soja é importante; disputas jurídicas e ações policiais coibindo o plantio dos OGM; confrontos institucionais quanto à competência para regulamentar e fiscalizar os OGM (órgãos federais com estaduais); embates no Legislativo estadual quanto às atribuições de fiscalização das instituições do governo local; e muitas declarações –pró e contra– os transgênicos, por parte de acadêmicos e de lideranças de organizações ligadas à agricultura ou à indústria.[12]
Apesar de toda essa disputa, o que vale, em primeiro lugar, é a decisão judicial em vigor que impede o plantio comercial de transgênicos. Para a Monsanto, essa dificuldade para comercializar a soja transgênica representou, na expressão de Cardoso e De Cesare (1999), um “duro golpe”. Mesmo assim ela dá sinais de que continuará seu programa de investimentos na área agrícola. Na área de semente de soja, de acordo com a declaração do gerente de negócios da Monsoy, Mário Sérgio de Lima, ao jornal Zero Hora (9/7/99), ela planeja investir 35 milhões de dólares até 2004, para ocupar 35% do mercado brasileiro (hoje está com 18%). Ao mesmo tempo, deve construir uma nova fábrica de herbicidas na Bahia (Cardoso e Cesare, 1999). Segundo Belmiro Ribeiro, diretor de comunicação da empresa no Brasil, “mesmo sem a liberação da soja Roundup Ready, há um grande espaço para a utilização do herbicida no Brasil.”
Este depoimento reforça a análise de que a entrada da Monsanto na engenharia genética se dá na perspectiva de valorização de seu principal produto, o herbicida Roundup. Os investimentos da empresa dão, por sua vez, claros indicativos de que ela voltará a estar fortemente mobilizada para defender o plantio de transgênicos na safra 2000/2001.
Conclusão
A difusão dos transgênicos no Brasil: retrocesso ou adaptação?Em face do cenário controvertido pelo qual se processa a difusão dos OGM em níveis nacional e internacional, pode-se dizer que os agricultores brasileiros encontram-se hoje diante de um impasse: ou eles adotam este novo pacote tecnológico, com uma visão de curto prazo que proporciona, aparentemente, vantagens econômicas consideráveis, mas cujos efeitos sobre a saúde humana e o ambiente não foram ainda suficientemente estudados; ou eles alinham-se a um esforço de resistência coletiva do qual participam os seus principais consumidores (europeus e japoneses),[13] apesar das incertezas associadas à heterogeneidade e à instabilidade dos movimentos sociais, assim como do grande poder político e econômico exercido pelas grandes empresas sementeiras.
A sorte da difusão dos OGM está lançada, com resultados especialmente inusitados no caso brasileiro. Pode-se observar, por um lado, a confiança que a Monsanto depositava na sua capacidade de aprovar seus produtos transgênicos, dada a facilidade com que obteve a aprovação junto ao FDA – considerado mundialmente o organismo regulamentar mais exigente. Por outro lado, observa-se o surgimento e a consolidação de um movimento social e político capaz de retardar a ação de um empresa multinacional que conta com o apoio de um governo liberal engajado na eliminação de todas as políticas de proteção do mercado nacional.
A análise da difusão dos OGM, proposta neste artigo, distancia-se, portanto, de uma análise estritamente econômica, ou “otimizadora”, no sentido neoclássico do termo que parte da existência de uma curva em S, do tipo “epidemiológico”. Nem o objeto nem o campo da difusão são imutáveis. Ao contrário, estes tendem a modificar-se ao longo do tempo, mediante um processo dinâmico que engloba diferentes dimensões (conhecimentos técnicos, ações sociais, ações governamentais, poder econômico). Tais evidências podem ser observadas mesmo nos EUA, onde já existem tendências de reversão das áreas plantadas com transgênicos, especialmente milho.[14] Ao mesmo tempo, as alternativas de oferta de preços majorados à produção de soja convencional incentivam a permanência e a resistência de “velhas” técnicas. Neste caso, as possibilidades de um retrocesso ou de adaptação no emprego das “novas” técnicas apresentam-se até o momento indefinidas. Resta-nos enfatizar, que o processo de difusão dos OGM revela a necessidade da construção de um referencial teórico mais elaborado capaz de integrar diferentes variáveis (econômicas, sociais, políticas) que contribuiriam para um melhor entendimento da assimilação do progresso técnico pelas sociedades.
Referências bibliográficas
Agribusiness. The gene exchange. A public voice on biotechnology and agriculture. Agribusiness, dezembro, 1996.
Almeida, J. A construção social de uma nova agricultura. Porto Alegre, EdUFRGS, 1999.
Arrow, K. El bienestar económico y la asignación de recursos para la invención. In: Rosemberg, N. (ed.) Economía del Cambio Tecnológico. Mexico: Fondo de Cultura, 1979.
Bloomberg News. Monsanto busca apoio científico a transgênico. Gazeta Mercantil, 31/8/ 99.
Bloomberg News. Monsanto compra unidade produtora de semente Unilever. Gazeta Mercantil, 16/7/98.
Bloomberg News. Plantio de milho transgênico deve ser menor nos EUA. Gazeta Mercantil, 5/1/00.
Branco, A. Faturamento da Monsanto cresce. Gazeta Mercantil, 14/7/98.
Cardoso, D. e Cesare, C. F. de. Monsanto mantém orçamento no Brasil. Gazeta Mercatil, 23 a 26/12/99.
Carvalho, S. P. de. Propriedade intelectual e o setor público de pesquisa agropecuária : alguns comentários. Cadernos de Ciência e Tecnologia. v.9, n. 1/3, 1992.
Cordeiro A. e Mello, B. de. La experiencia de la “Rede Milho”. Biodiversidad, n. 1, 1994.
Ehlers, E. Agricultura sustentável; origens e perspectivas de um novo paradigma. São Paulo, Livros da Terra, 1996.
Eurostaf, Les biotechnologies agro-industrielles dans le monde. Collection Analyses de Secteurs, 2ème trimestre, 1989.
Ferrara, J. Les vases comunicants entre Monsanto et l’administration. Courrier International, n. 452, 1er-7 Juillet, 1999.
Folha de São Paulo. Monsanto investe US$ 550 mi na Bahia. Folha de São Paulo, 14/1/00.
Griliches, Z. El maíz híbrido y la economía de la innovación. In: Rosemberg, N. (ed.) Economía del Cambio Tecnológico. Mexico: Fondo de Cultura, 1979.
II Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa. Anais... Rio de Janeiro, FAEAB, 1985.
III Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa. Anais... Cuiabá, FAEAB, 1987.
La Rotta, A. Uso dos transgênicos cresce nos EUA. Gazeta Mercantil, 19-25/4/99.
Mansfield, E. El cambio técnico y la tasa de imitación. In Rosemberg, N. (ed.) Economía del Cambio Tecnológico. Mexico: Fondo de Cultura, 1979.
Pelaez, V. e Poncet, C. A Monsanto e a engenharia genética: acumulação de competências e gestão do risco. Revista de Economia, n. 22, 1998.
Rosemberg, N. Factores que afectan la difusión de tecnología. In: Tecnología y Economía. Barcelona: Gustavo Gili, 1979.
Teece, D. Profiting from technological innovation: implications for integration, collaboration, licesing and public policy. Research Policy, n. 15, 1986.
Torriglia, A. et al. Os agricultores argentinos reduzem custos em até 15%. Gazeta Mercantil, 19-25/4/99.
Torriglia, A. Quase 100% da soja argentina é transgênica. Gazeta Mercantil, 1-7/11/99.
Weber, D. Aprovada soja transgênica da Monsanto. O Estado de São Paulo, 25/9/98.
Zanatta, M. e Cardona, I. Múltis controlam sementes de milho. Gazeta mercantil, 16/7/99.
Zero Hora. Monsanto detém 60% do milho no Brasil. Zero Hora, 9/6/99.
Notas
[1] O estado do Rio Grande do Sul é atualmente o terceiro maior produtor de soja do país, correspondendo a 22% da produção nacional.
[2] O texto de Griliches foi originalmente publicado sob o título “Hybrid corn and the economics of innovation”, Science, 29/7/60, p. 275-280.
[3] A Embrapa Sementes é a primeira produtora nacional de sementes de soja, detendo cerca de 60% do mercado.
[4] Inicialmente Projeto Tecnologias Alternativas, ligado à Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE, uma ONG criada no início da década de 60, com sede no Rio de Janeiro mas com trabalhos em diversos estados brasileiros. Depois, o Projeto ficaria autônomo e a coordenação da rede de entidades (Rede PTA), criada no período anterior, ficou com uma nova ONG, a AS-PTA (Assessoria em Projetos de Tecnologias Alternativas).
[5] “O escândalo das sementes; o domínio na produção de alimentos”, editado pela Nobel e publicado em 1987.
[6] Em agosto de 1977, o Ministério da Agricultura anunciaria o “adiamento” do encaminhamento do projeto. Todo esse processo é melhor descrito por Adilson Paschoal, no “Prefácio do Tradutor” de Mooney (1987). Este episódio é citado e analisado, também, por Velho (1990), por Olalde (1992) e por Pessanha et alli. (1993). Estes últimos julgam que o fracasso da tentativa deveu-se tanto à mobilização dos segmentos sociais contrários à aprovação da lei, como da ideologia nacional-desenvolvimentista do governo militar da época, que tomava a segurança alimentar como uma questão estratégica.
[7] Essa proposta seguia, em linhas gerais, a Convenção da UPOV (União para a Proteção de Obtenções Vegetais), de 1978. Para as características desta convenção veja-se, por exemplo, Carvalho (1992).
[8] Pela lei 8.974, de 5/1/95, que cria a CTNBio, e pelo decreto 1.752, de 20/12/95, que a regulamenta, compete a ela, entre outros, “propor a política nacional de biossegurança” e “(...) o código de ética de manipulações genéticas”; “...emitir parecer técnico prévio conclusivo sobre qualquer liberação de OGM no meio ambiente, encaminhando-o a órgão competente” e “(...)sobre registro, uso, transporte, armazenamento, comercialização, consumo, liberação e descarte de produto contendo OGM e derivados, encaminhando-o ao órgão de fiscalização competente”; “...exigir como documento adicional, se entender necessário, Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e respectivo Relatório de Impacto no Meio Ambiente (Rima) de projetos e aplicação que envolvam a liberação de OGM no meio ambiente, além das exigências específicas para o risco aplicável”. Ela vincula-se ao Ministério da Ciência e Tecnologia e deve ser composta por oito especialistas de notório saber científico e técnico, em exercício ao segmento de biotecnologia, sendo dois da área humana, dois da área animal, dois da área vegetal e dois da área ambiental; um representante de cada um dos seguintes Ministérios, indicados pelos respectivos titulares: da Ciência e Tecnologia; da Saúde; do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal; da Educação e do Desporto; das Relações Exteriores; dois representantes do Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária, sendo um da área vegetal e o outro da área animal, indicados pelo respectivo titular; um representante de órgão legalmente constituído de defesa do consumidor; um representante de associações legalmente constituídas, representativas do setor empresarial de biotecnologia, a ser indicado pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, a partir de listas tríplices encaminhadas pelas associações referidas; e um representante de órgão legalmente constituído de proteção à saúde do trabalhador.
(cf. htttp://www.mct.gov.br/cntbiotec, capturado em 26/1/2000).
[9] Os indícios da existência de contrabando de sementes de soja começam a surgir em notícias como a do jornal O Estado de São Paulo que informava, no dia 10 de março de 1999, que a análise de um carregamento de farelo de soja, comprado no Brasil, por um importador francês, havia revelado a presença de OGM.
[10] É interessante destacar que 70% deste cultivo são feitos no sistema de plantio direto, no qual o uso de herbicidas é importante.
[11] Denúncias dão conta que, na época de plantio, os próprios vendedores da Monsoy, sem disfarce algum, fizeram dias de campo e venderam soja transgênica aos agricultores.
[12] Uma ampla cobertura é feita pelo jornal Zero Hora de Porto Alegre, em uma rubrica Biotecnologia, nos meses de outubro e novembro de 1999. Destaque-se, apenas como exemplo, “A soja pirata”, por Renata Menasche, em 15 de outubro; “Prefeito lidera manifestações contra inspeção de lavouras e faz campanha pelo plantio de soja transgênica”, por Patrícia Spetch, em 12 de novembro. Do Correio do Povo, outro jornal de Porto Alegre, destaque-se matéria de 9 de dezembro: “Assembléia aprova lei para impedir que o estado fiscalize transgênicos”. É importante registrar, também, a posição do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Rio Grande do Sul. Ao final do seu décimo congresso estadual, sua direção informou que todas as terras cultivadas com transgênicos serão ocupadas nos próximos dois anos. Para um dirigente estadual, “as terras cultivadas com transgênicos têm que ser enquadradas na mesma lei que reprime as plantações de psicotrópicos” – segundo a lei, as áreas devem ser desapropriadas – (cf. Zero Hora, 18/12/99, “Sem-terra preparam invasões em lavouras trangênicas”, por Géssica Trindade).
[13] A Europa e o Japão respondem por 70% do mercado de soja brasileira.
[14] A Associação dos Produtores Americanos de Milho prevê uma redução de 20% a 25% na área plantada com grãos transgênicos nos EUA (Bloomberg News, 5/1/2000).